Feitiçarias |
Qualquer pessoa com força hipnótica inconsciente, ao olhar um menino, fere violentamente seu corpo vital e o resultado não se faz muito esperar. Em seguida surgem na vítima grandes olheiras, vômito, febre, diarreia etc. Os médicos costumam diagnosticar infecção intestinal e receitam muitos antibióticos, xaropes etc. No entanto, as crianças em vez de melhorar pioram e morrem.
Que se pode fazer são fortes passes magnéticos, de baixo a cima, sobre o rosto e pálpebras do menino com o firme propósito de eliminar os fluidos vitais tenebrosos.
Convém acender um fogo, vela ou chama e ler para as crianças a Conjuração dos Sete do sábio Salomão tal como está escrita aqui. Deve-se também benzer o menino enfermo na fronte, no peito, sobre a cabeça e nas costas, enquanto se lê os quatro evangelhos.
P: Ler os quatro evangelhos é muito comprido, não se poderia abreviar alguma coisa?
Infelizmente, são muito raros os curadores que sabem diagnosticar de verdade uma doença ocasionada por feitiçaria. Vou citar um caso especial relatado pelo sábio Waldemar. Segue entre aspas porque não me agrada ser adornado com plumas alheias, mas como é realmente um caso sensacional, é bom que nossos leitores o conheçam: Um dos casos mais interessantes de ciúmes vampirescos o experimentou o investigador e ocultista francês Eliphas Levi (abade Constant).
Durante sua permanência em Londres, Eliphas Levi travou amizade com um jovem duque, cuja casa visitava quase que diariamente. Fazia pouco tempo que o duque tinha se casado com uma jovem princesa francesa de extraordinária beleza, contudo o fizera contra a vontade de sua família protestante, já que a jovem era católica praticante.
O duque, como o comprovou Levi, tinha levado durante muitos anos uma vida um tanto frívola, para não dizer libertina, tendo por amante durante muito tempo uma jovem italiana, bailarina de balé. No fim a abandonou já que na realidade amava apenas a sua esposa.
Certa tarde, a duquesa enfermou , motivo que a levou a acamar-se. Os médicos diagnosticaram um princípio de gravidez, porém logo ficou demonstrado que a sua debilidade devia ter outra causa.
Apesar de o duque haver consultado os mais famosos médicos de Londres, eles viram-se diante de um enigma. Foram empregados os mais diferentes remédios sem êxito algum. Frequentava o palácio do duque também um velho abade francês que conhecia a princesa já de Paris.
Esse ancião agradou-se de conversar com Eliphas Levi especialmente de problemas metafísicos, pois ele também se interessava sobre o tema há décadas e não apenas teoricamente. Certa noite ficaram a sós no salão, pois o duque preocupado se fora para o quarto para ficar ao lado de sua esposa enferma. Era uma noite fria e úmida.
Fora, a célebre névoa londrina ondulava empanando a luz dos lampiões. De repente, o abade agarrou uma das mãos de Levi e disse com voz baixa: “Escute, querido amigo, desejaria falar de algo com você. Posso confiar com sua inteira descrição?”
Levi respondeu afirmativamente e o abade prosseguiu: “Tenho todos os motivos para supor que a doença da duquesa não é natural. Conheço a Mildred desde pequena e sempre foi uma garota mais saudável do que se possa imaginar. Agora, torna-se lânguida e se debilita dia a dia; parece-me que está sendo dessangrada misteriosamente”.
“Acredita você que se ache sob o influxo de algum poder obscuro? Que está em jogo algum sortilégio?” perguntou Levi. “Posso confiar e muito em minha voz interna e por isso quase me atreveria a dizer que nessa enfermidade há algo que não vai como deve. Queres ajudar-me a romper o encantamento.” “Com muito prazer”, respondeu Levi. “Bem, em tal caso não devemos perder mais tempo. Agradeceria que meia hora antes da meia-noite viesse ao meu domicílio para uma conjuração conjunta. Tentarei interpelar o poder tenebroso. Caso nos chegue uma resposta do além…”
Depois dessa conversação, Eliphas Levi tomou umacarruagem e rapidamente transladou-se para sua residência, onde se lavou, se enfeitou e mudou de roupa das cabeças aos pés, pois os espíritos da zona média, que era os que o abade pretendia invocar, exigiam de seus conjuradores a mais escrupulosa limpeza.
Também o traje devia estar de acordo com sua natureza; não suportavam nenhum tecido animal pelo que ficavam descartados os de lã, assim como os sapatos de couro ou de qualquer pele.
Como a casa do abade situava-se no nordeste, em Hampstead Heath, e Eliphas Levi vivia na Praça Russel, ou seja, era considerável a distância entre ambos os lugares, Eliphas Levi teve de fazer seu exigente asseio com certa pressa, uma vez que queria estar lá no horário combinado. Uns 40 minutos antes da meia-noite chegou a Hampstead Heath.
O abade em pessoa, todo de branco, abriu-lhe a porta e o conduziu por uma elevada escalinata a um aposento que se achava em um extremo do corredor do primeiro piso. Os olhos de Eliphas Levi tiveram primeiro de acostumar-se com a obscuridade: chamazinhas azuladas e trêmulas queimavam um incenso que cheirava a âmbar e almíscar.
Nessa luz incerta, Eliphas observou uma grande mesa circular que se encontrava no centro da habitação, e, plantado sobre ela, o crucifixo invertido, símbolo do falo. Junto à mesa estava um homenzinho delgado. O abade comentou: “É meu criado. Você já sabe que é indispensável a cifra de três para essas conjurações. Começa você com a primeira invocação”.
Este convite da parte do abade era mais que uma cortesia, pois as potências da zona média poderiam enojar-se e vingar-se sobre o dono da casa, causando-lhe até a morte, caso permitisse rebaixar a harmonia de sua esfera por um intruso incompetente. Ceder pois a invocação ao amigo era mostra de que considerava a Eliphas como mestre de primeira categoria na magia. Tal suposição era em verdade justificada.
Se alguém podia executar com êxito, com gesto desembaraçado e sem temor, com coração puro e uma vontade fortalecida por numerosas provas, as cerimônias milenares da sagrada magia, era este homem. Ele exercia no reino dos espíritos tanto domínio quanto no mundo das criaturas encarnadas e adeptos.
Entre o véu de fumo, Eliphas estendeu a mão instintivamente à esquerda. Lá devia estar o recipiente com água benta que devia ter sido recolhida em uma noite de plenilúnio de uma cisterna, velando-se e orando-se sobre ela durante vinte e uma noites. Em seguida, fez uma aspersão pelos quatro ângulos da habitação.
O abade fazia às vezes de acólito e movimentava o incensário ondulatoriamente. No fumo, começaram a formar-se figuras estranhas e, ao mesmo tempo, pareceu-lhes que um frio, gelado, brotava do chão e chegava-lhe até a ponta dos cabelos, dificultando-lhes a respiração.
Eliphas Levi proferiu agora com mais força as palavras de invocação. Subitamente, as paredes do quarto pareceram retirar-se como se um abismo infinito e astral se abrisse na frente deles, ameaçando engoli-los. Brilharam os esplendores de uma cintilantes luminosidade e os olhos se cobriram para não ofender o espírito invocado com um olhar indiscreto.
Com régia voz, Levi perguntou a causa da enfermidade da duquesa Mildred.
Não recebeu resposta. As emanações de fumo ficaram espessas de tal modo que ameaçaram sufocar os sentidos. Precipitando-se rumo à janela, Eliphas ouviu subitamente uma voz, a qual, ainda que forte e retumbante, parecia sair do mais profundo de si mesmo e encher todo o espaço de sua alma.
O que a voz lhe gritou era tão espantoso que suas pernas se negaram a mover-se e ficou como que petrificado no mesmo lugar onde se encontrava. Agora foi a vez de o abade se precipitar para junto da janela, porém suas mãos trêmulas, sem forças, não conseguiram abri-la. O criado que assistira passivamente a invocação jazia desmaiado no chão.
Por fim, Eliphas saiu de sua paralisia e rompeu o cristal com o crucifixo, absorvendo o ar fresco da noite com fruição em companhia do abade, especialmente ele que banhava por assim dizer, sua cabeça febril na névoa úmida. Por todos seus nervos corria a espantosa acusação que o misterioso espírito havia lançado com clareza inequívoca contra ele.
Quando por fim se recobrou, voltou para o quarto. O fumo tinha se dissolvido, mas a lamparina seguia ardendo tenuemente. O abade, palidíssimo, contemplava a Eliphas com os olhos dilatados e balbuciou: “Você é realmente culpado, meu amigo? Não posso acreditar!”
“Você também ouviu a resposta do espírito?”, perguntou Levi. O abade deixou cair a cabeça, como que oprimido, num gesto de concordância. “Sim…”, sussurrou apenas perceptivelmente. Levi se manifestou com veemência: “Juro-lhe que tomei o símbolo com mãos puras e que em minha vida jamais cometi um crime. Juro-lhe que não estou manchado de sangue”.
Ao dizer essas palavras, aproximou-se mais da lâmpada de maneira que o brilho dela caiu em cheio sobre ele. Espantado, o abade apontou com o dedo a mandíbula e a peiteira da camisa de Eliphas. “Aí, olhe você mesmo no espelho…”, disse tomando a mão do amigo e conduzindo-o a um grande espelho de parede que pendia no quarto contíguo.
Ali, comprovou Eliphas um corte em sua barba com umas gotinhas de sangue; também em sua camisa apareciam outras gotinhas. Devia ter se cortado ao fazer apressadamente a barba… Assim, a resposta do espírito explicava-se perfeitamente: “Eu não falo com alguém manchado de sangue”.
Levi sentiu seu coração se aliviar de um enorme peso, não obstante o abade parecia mais acabrunhado e tinha se deixado cair sobre um sofá, contraía os ombros convulsivamente e escondia o rosto com as mãos, Levi tentou acalmar o ancião, porém ele o rechaçou dizendo: “Trata-se da pobre Mildred, cada hora consome sua vida. Não fosse por isso, poderíamos invocar o espírito de novo em três vezes 21 dias, com as devidas oferendas e orações… porém o tempo é demasiado, nesse ínterim Mildred morrerá”.
Levi não soube o que responder e fechou-se em um denso silêncio que obrigou o abade a levantar-se e a andar com passos vacilantes de um lado a outro da sala: “Custe o que custar, devo obter uma resposta… a qualquer preço. Prometa, meu amigo, que não me abandonará!
Uma vigorosa determinação lia-se na mirada do ancião e para tranquilizá-lo Eliphas respondeu: “Dou-lhe a minha palavra. Ponho-me a sua disposição como mago. Como o objetivo ainda não foi alcançado, mantenho a palavra dada”. “Então, permaneça aqui, dentro de 12 horas efetuaremos outra conjuração; invocaremos os espíritos da zona baixa”, disse o abade. Eliphas sobressaltou-se. Teria o velho ficado louco? “Você… o quê? Você… um filho da Igreja quer entrar em contato com os espíritos infernais? Não, isso não está sequer na intenção da devota duquesa. Renuncie a isso, não arrisque sua alma.”
É ostensível que invocar demônios é magia negra. É claro que a magia negra traz fome, nudez, enfermidades e calamidades físicas e morais.
Havia tal glacial decisão nas palavras e gestos do abade que Eliphas sentiu que toda réplica seria vã. Contra sua vontade, mais por lealdade à palavra dada, aceitou a solicitação do amigo. Ficou como hóspede na casa. Depois da extraordinariamente fatigante e tensa conjuração anterior, dormiu tão profunda e pesadamente que despertou tarde da manhã.
O dia foi passado com as devidas purificações e orações. De noite, Eliphas recebeu a roupa apropriada para o serviço com o diabo, bem como os demais requisitos. Como já manifestara antes, o abade não tomaria parte ativa na invocação. Somente o assistiria como acólito, mas mesmo assim vestiu-se com a roupagem prescrita.
O que aconteceu após é algo que francamente e de maneira alguma quero transcrever porque há responsabilidades na palavra. Neste caso é preferível calar, porque o silêncio é a eloquência da sabedoria. É notório que se alguém transcreve parágrafos tenebrosos, converte-se em cúmplice do delito. Isto é semelhante a ensinar magia negra às pessoas.
Felizmente, os invocadores do presente relato não conseguiram tornar visíveis e tangíveis os demônios invocados. A única coisa que conseguiram foi fazer brotar de uma parede uma salamandra, pequena e inocente criatura do fogo.
O abade, fazendo provisão de todas suas forças, perguntou pela doença da duquesa. “Batráquios”, falou a salamandra com voz infantil e no mesmo instante desapareceu. Eliphas viu então como o abade cambaleava e desabava no chão.
Imediatamente, tomou nos braços seu magro corpo e o levou para o dormitório, onde despindo o ancião o pôs na cama, indo logo buscar o criado para que trouxesse algum reconstituinte. Ao voltar, encontrou o abade completamente restabelecido, mas sua aparência era a de um homem abatido, parecia haver envelhecido muitos anos.
Obviamente, o abade estava fazendo esforços sobre-humanos para salvar a duquesa.
“Tudo inútil, a pobre Mildred haverá de morrer. Minha alma…, ó minha alma… o que quer dizer ‘batráquios’?”, exclamava, com voz febril. “Apenas sei que é uma palavra grega que significa rãs”, respondeu Eliphas.
O criado não tardou a chegar com vinho e biscoitos, porém o abade repeliu todo alimento. Eliphas tomou um pouco e tentou arrancar o amigo de sua desesperada letargia, mas foi inútil sua pretensão em reanimá-lo. Com o coração oprimido retirou-se para sua moradia. No dia seguinte, informou-se sobre como estavam o abade e a duquesa.
Mildred ia cada vez pior. Seu médico de cabeceira dava por certo seu óbito. Também o abade achava-se em estado grave. Negava qualquer alimento e inicialmente não respondeu as perguntas do amigo, depois manifestou sua intenção de por fim aos seus dias mediante a inanição. Profundamente entristecido, Levi despediu-se, preocupando-se muito com as trágicas conseqüências do pecaminoso conjuro.
Durante as duas tardes seguintes, afundou-se outra vez nos seus costumeiros estudos e enquanto lia o Enquiridion de Leão III deteve-se no ponto no qual, através da chave de Trithenus, se decifrava do esotérico e cabalístico escrito o seguinte: “Um apreciável encantamento maléfico é o da rã”.
Abstemo-nos de entregar a fórmula secreta do sapo para não dar armas aos perversos criminosos da magia negra.
Como um relâmpago, o trecho atravessou a mente de Eliphas. Sem fechar o livro pôs o sobretudo e lançou-se através das ruas de Londres que iam sumindo no crepúsculo vesperal. Por fim, achou uma carruagem e pareceu-lhe insuportável e longo o tempo que levou para chegar ao palácio do duque. Rostos chorosos o receberam. Informaram-lhe: “… a duquesa está em agonia. Já estão administrando-lhe os últimos sacramentos…”
“Eu posso salvá-la”, exclamou Eliphas e afastando os espantados criados precipitou-se em direção ao quarto de Mildred, onde achou o duque. Com a respiração ofegante, suplicou-lhe: “Você me conhece o suficiente para saber que sou de confiança. Creia-me pois que não se perdeu toda a esperança.
Enquanto a duquesa viver não há porque se desesperar. Rogo que me deixe a sós com ela e pelo amor de Deus não me pergunte nada … tenha confiança em mim”. Ainda que atônito e confuso ao extremo, o duque acedeu ao desejo de Eliphas pedindo aos presentes: um médico, um sacerdote e uma donzela de companhia, que abandonassem a paciente.
Uma vez só, Levi fechou a porta atrás de si e se aproximou do leito da princesa. “Era o que supunha”, murmurou ao ver Mildred sumida em uma espécie de catalepsia com os olhos brancos. Seus lábios estavam roxos e respirava com suave estertor.
Imediatamente, Levi pôs mãos à obra e começou a levantar o assoalho da soleira da porta, porém a madeira resistiu aos seus trêmulos dedos. Sacou sua navalha de bolso, cuja folha se rompeu no frenético intento. Finalmente e com força desesperada, conseguiu levantar o sarrafo. Sangravam-lhe os dedos e seu esforço tinha sido baldio… Nada estava oculto ali. Levantou os tapetes… tampouco. Tornou a olhar a duquesa que respirava com dificuldade.
Reparou que sua mão esquerda pendia singularmente contraída para um lado. “A cama!”, pensou, e com a certeza de agora procurar no lugar certo, levantou a enferma de seu leito e a depositou tão suave quanto pôde sobre um sofá que estava contra a parede. Dedicou-se a seguir com uma crescente excitação a revolver cobertores e almofadas, mas nada… nada de novo.
Tirou o colchão e o desfez, tateou, apalpou, remexeu sua crina… e… seus dedos tropeçaram em um objeto mole, esponjoso, agarrou-o e retirou-o. Com efeito era aquilo que buscava… precipitou-se para fora do quarto.
Provou ao duque em breve explicação o problema e este colocou à sua disposição uma carruagem que o transportou com a maior rapidez a sua casa.
Chegando lá, pôs se a executar uma nova tarefa, a de queimar em chamas de pez e enxofre a besta dos infernos, seguindo ao pé da letra a prescrição do Enchiridion.
Abriu a janela do quarto para o mau cheiro sumir dele. Oprimido por enorme cansaço, lançou-se vestido como estava na cama e num instante sumiu em profundo sono.
No dia seguinte, foi recebido como um salvador no palácio do duque. De maneira de causar pasmo e absolutamente incompreensível para os médicos, o estado de saúde da jovem duquesa havia melhorado a tal ponto que se podia falar de uma franca superação da crise. A própria Londres, no dia 28 de outubro de 1865, impressionou-se com a sensacional notícia de que a diva do balé, Marie Bertin, tinha falecido repentinamente sem enfermidade alguma.
Esta não foi a única notícia. Poucas horas depois era também arrebatada pela morte uma parente próxima do duque, velha solteirona que havia sido apaixonada inimiga de Mildred e que em vão tentara impedir o casamento do duque com a princesa católica.