Epicuro de Samos (em
grego antigo: Ἐπίκουρος, Epikouros, "aliado, camarada"; 341 a.C.,
Samos — 271 ou 270 a.C., Atenas) foi um filósofo grego do período helenístico.
Seu pensamento foi muito difundido e numerosos centros epicuristas que se
desenvolveram na Jônia, no Egito e, a partir do século I, em Roma, onde
Lucrécio foi seu maior divulgador.
Vida
Epicuro nasceu na Ilha
de Samos, em 341 a.C., mas ainda muito jovem partiu para Téos, na costa da Ásia
Menor.[1] Quando criança estudou com o platonista Pânfilo por quatro anos e era
considerado um dos melhores alunos. Certa vez, ao ouvir a frase de Hesíodo,
"todas as coisas vieram do caos", ele perguntou: "E o caos veio
de que?". Retornou para a terra natal em 323 a.C. Sofria de cálculo renal,
o que contribuiu para que tivesse uma vida marcada pela dor.
Epicuro ouviu o
filósofo acadêmico Pânfilo em Samos, que não lhe foi de muito agrado. Por isso
foi mandado para Téos pelo seu pai. Com Nausífanes de Téos, discípulo de
Demócrito de Abdera, Epicuro teria entrado em contato com a teoria atomista —
da qual reformulou alguns pontos. Epicuro ensinou filosofia em Lâmpsaco,
Mitilene e Cólofon até que em 306 a.C. fundou sua própria escola filosófica,
chamada O Jardim, onde residia com alguns amigos, na cidade de Atenas. Lecionou
em sua escola até a morte, em 270 a.C., cercado de amigos e discípulos e tendo
sua vida marcada pelo ascetismo, serenidade e doçura.
Filosofia e obra
O propósito da
filosofia para Epicuro era atingir a felicidade,[2] estado caracterizado pela
aponia, a ausência de dor (física) e ataraxia ou imperturbabilidade da alma.
Ele buscou na natureza as balizas para o seu pensamento: o homem, a exemplo dos
animais, busca afastar-se da dor e aproximar-se do prazer. Estas referências
seriam as melhores maneiras de medir o que é bom ou ruim. Utilizou-se da teoria
atômica de Demócrito para justificar a constituição de tudo o que há. Das
estrelas à alma, tudo é formado de átomos, sendo, porém de diferentes
naturezas. Dizia que os átomos são de qualidades finitas, de quantidades infinitas
e sujeitos a infinitas combinações.
A morte física seria o
fim do corpo (e do indivíduo), que era entendido como somatório de carne e
alma, pela desintegração completa dos átomos que o constituem. Desta forma, os
átomos, eternos e indestrutíveis, estariam livres para constituir outros
corpos. Essa teoria, exaustivamente trabalhada, tinha a finalidade de explicar
todos os fenômenos naturais conhecidos ou ainda não e principalmente extirpar
os maiores medos humanos: o medo da morte e o medo dos deuses.
Naqueles tempos,
Epicuro percebeu que as pessoas eram muito supersticiosas e haviam se afastado
da verdadeira função das religiões e dos deuses. Os deuses, segundo ele, viviam
em perfeita harmonia, desfrutando da bem-aventurança (felicidade) divina. Não
seria preocupação divina atormentar o homem de qualquer forma. Os deuses
deveriam ser tomados como foram em tempos remotos, modelos de bem-aventurança
que servem como modelo para os homens e não seres instáveis, com paixões
humanas, que devem ser temidos.
Desta forma, procurou
tranquilizar as pessoas quanto aos tormentos futuros ou após a morte. Não há
por que temer os deuses nem em vida e nem após a vida. E, além disso, depois de
mortos, como não estaremos mais de posse de nossos sentidos, será impossível
sentir alguma coisa. Então, não haveria nada a temer com a morte.
No entanto, a caminho
da busca da felicidade, ainda estão as dores e os prazeres. Quanto às dores
físicas, nem sempre seria possível evitá-las. Mas Epicuro faz questão de frisar
que elas não são duradouras e podem ser suportadas com as lembranças de bons
momentos que o indivíduo tenha vivido. Piores e mais difíceis de lidar são as
dores que perturbam a alma. Essas podem continuar a doer mesmo muito tempo
depois de terem sido despertadas pela primeira vez. Para essas, Epicuro
recomenda a reflexão. As dores da alma estão frequentemente associadas às
frustrações. Em geral, oriunda de um desejo não satisfeito.
Encontra-se, aqui, um
dos pontos fundamentais para o entendimento dessa curiosa doutrina, que também
foi tomada por seus seguidores e discípulos como um evangelho ou boa nova, o
equacionamento entre dores e prazeres. Das 300 obras escritas pelo filósofo,
restaram apenas três cartas que versam sobre a natureza, sobre os meteoros e
sobre a moral, e uma coleção de pensamentos, fragmentos de outras obras
perdidas. Estas cartas, com os fragmentos, foram coligidos por Hermann Usener
sob o título de Epicurea em 1887, mas, mais tarde, Hermann Diels descobriu que
os fragmentos eram, na verdade, de Leucipo.[3] Por suas proposições
filosóficas, Epicuro é considerado um dos precursores do pensamento anarquista
no período clássico.
A certeza
Segundo Epicuro, para
atingir a certeza é necessário confiar naquilo que foi recebido passivamente na
sensação pura e, por consequência, nas ideias gerais que se formam no espírito
(como resultado dos dados sensíveis recebidos pela faculdade sensitiva).
O atomismo[editar |
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Epicuro defendia
ardorosamente a liberdade humana e a tranquilidade do espírito. O atomismo,
acreditava o filósofo, poderia garantir ambas as coisas desde que modificado. A
representação vulgar do mundo com seus deuses, o medo dos quais fez com que se
cometessem os piores atos, é obstáculo à serenidade. Todas as doutrinas
filosóficas, salvo o atomismo, participam dessas superstições, segundo Epicuro.
No sistema epicurista,
os átomos se encontram fortuitamente por uma leve inclinação em sua trajetória,
que os fariam chocar-se com outros átomos para constituir a matéria. Esta é a
grande modificação em relação ao atomismo de Demócrito, onde o encontro dos
átomos é necessário. A inclinação a que o átomo se desvia poderia ser por uma
vontade, um desejo ou por afinidade com outro átomo. Precisamente este é o
ponto fosco na teoria atômica de Epicuro. Provavelmente Epicuro o explicou
melhor em alguma de suas obras perdidas. Certo é que este encontro fortuito dos
átomos garante a liberdade (se assim não fosse, tudo estaria sob o jugo da
Natureza) e a explicação dos fenômenos, fazendo com que possam ser explicados
racionalmente. Assim, ao compreender como opera a Natureza, o homem pode
livrar-se do medo e das superstições que afligem o espírito.
O prazer
A doutrina de Epicuro
entende que o sumo bem reside no prazer, e, por isso, foi uma doutrina muitas
vezes confundida com o hedonismo.[4] O prazer de que fala Epicuro é o prazer do
sábio, entendido como quietude da mente e o domínio sobre as emoções e,
portanto, sobre si mesmo. É o prazer da justa medida e não dos excessos. É a
própria Natureza que nos informa que o prazer é um bem. Este prazer, no
entanto, apenas satisfaz uma necessidade ou aquieta a dor. A Natureza
conduz-nos a uma vida simples. O único prazer é o prazer do corpo e o que se
chama de prazer do espírito é apenas lembrança dos prazeres do corpo. O mais
alto prazer reside no que chamamos de saúde. Entre os prazeres, Epicuro elege a
amizade. Por isso, o convívio entre os estudiosos de sua doutrina era tão
importante a ponto de viverem em uma comunidade, o "Jardim". Ali, os
amigos poderiam se dedicar à filosofia, cuja função principal é libertar o
homem para uma vida melhor.[5]
Traduções
Há, em português,
tradução de uma das cartas de Epicuro, a sobre a felicidade (a Meneceu), feita
por Álvaro Lorencini e Enzo Del Carratore, em edição bilíngüe. Também há uma
tradução mais recente da mesma Carta que foi feita por Thiago Harrison Felício,
em 2014, na sua dissertação de mestrado.
Desejo
Classificação dos desejos segundo Epicuro
|
|||||
Desejos naturais
|
Desejos frívolos
|
||||
Necessários
|
Simplesmente naturais
|
Artificiais
|
Irrealizáveis
|
||
Para a felicidade (eudaimonia)
|
Para a tranquilidade do corpo (protecção)
|
Variações de prazeres, busca do agradável
|
Exemplo: imortalidade
|
||
Traduções
EPICURO. Carta sobre a
felicidade (a Meneceu). Trad. e apresent. de Álvaro Lorencini e Enzo Del
Carratore. São Paulo: UNESP, 1997.
EPICURO. Obras. Estudio
preliminar, traducción y notas de Montserrat Jufresa, 2a edición, Madrid:
Editorial Tecnos, 1994.
FARRINGTON, Benjamin. A
doutrina de Epicuro. Tradução de Edmond Jorge. Rio de Janeiro: Zahar Editores,
1968.
FERRATER MORA, J.
Diccionario de Filosofía. Tomos I e II. Barcelona: Editorial Ariel, 1994.
GUAL, Carlos Garcia.
Epicuro. Madrid: Alianza Editorial, 1996.
LUCRÉCIO, Tito. Da
Natureza. Coleção Os Pensadores, volume V. São Paulo, Editora Abril, 1973.
RUSSELL, Bertrand.
Obras filosóficas. Tradução de Breno Silveira. Vol I. São Paulo: Companhia
Editora Nacional, 1969.
SPINELLI, Miguel. Os
Caminhos de Epicuro. São Paulo: Loyola, 2009; Idem. Epicuro e as bases do
epicurismo. São Paulo: Paulus, 2013.
ULLMANN, Reinholdo A.
Epicuro o filósofo da alegria. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1996.
FELÍCIO, Thiago
Harrison. A primazia da phrónesis sobre a philosophía em Epicuro. Dissertação
de Mestrado. Disponível em:
"http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000934594".
2014.
Na literatura e cultura
popular
Na Divina Comédia, de
Dante Alighieri, Epicuro é colocado no Inferno como um Herege. Ele está na 6º
Prisão, junto com seus seguidores, na cidade de Dite. A pena dos hereges é
serem enterrados em túmulos ardentes e abertos, tendo os membros queimados pela
areia quente.
Virou personagem em
quadrinhos na série "Epicuro, o Sábio" [6], de William Messner-Loebs.